Desde 2013 para cá, com as jornadas de manifestações que se sucederam em todo o país, a militância anarquista foi alcançada por seus efeitos e desdobramentos. Alvo de criminalizações de todas as ordens, também obteve maior visibilidade, dada a força da proposta e da crítica que essa tradição ainda oferece aos problemas dos tempos que correm. Um outro resultado entretanto que merece especial atenção de todas as anarquistas preocupadas com a implementação e desenvolvimento da ideologia, é o surgimento de um protagonismo de sujeitos, acompanhado de um (nem sempre) sutil apartamento de organizações anarquistas do bojo das lutas sociais. Atentas e preocupadas em reafirmar a importância da crítica ao vanguardismo,  compartilhamos aqui algumas breves reflexões, como contribuição para o debate e sobretudo para a prática anarquista.

Para aqueles que cultivam revoluções em estufa

 

Para aqueles que cultivam revoluções em estufa

 

O anarquismo surge no século XIX como ideologia do campo socialista e resultado, em um primeiro momento, das experiências operárias mutualistas e coletivistas. Portanto, o anarquismo nasce como parte integrante de um todo no qual a substância social permanece difusa sem seu correspondente teórico e este menos pertinente sem as suas realizações concretas. Assim a ideologia passa a servir ao conjunto de uma determinada classe, sendo por ela simultaneamente enriquecida e, inclusive, reavaliada em parte de seus pressupostos.

Com efeito, o papel central do anarquismo é a luta e a transformação da sociedade, objetivos a serem perseguidos pelos que se intitulam libertários. A ideologia não serve para salvar os indivíduos da monotonia de suas existências, ou mesmo dar sentido às mesmas, ela é antes uma orientação geral para a superação de um estado de coisas em favor de algo substancialmente melhor para todos e todas.

No atual contexto algumas correntes estão trocando a disposição para a luta, pela luta para a disposição. Uma disposição que visa menos ao foco no projeto classista e mais à projeção de certas personalidades. De eminências que contribuem cada vez menos para o classismo anarquista e cada vez mais para as suas reputações. Encontra-se em marcha um projeto de anarquismo a se esgotar nas biografias privadas, no voluntarismo interpessoal, nas sagas midiáticas. Um que nada tem de emancipador e que por isso não precisa pactuar com os produtores das riquezas qualquer tática ou estratégia. Um que se esgote no espaço de uma geração, para homenagear seus “próceres”, ainda que a custa da tradição anarquista que impede a existência da ideologia sem a sua inserção em bases sociais sólidas.

O risco de uma ideologia sem ossatura ou de um movimento social descarnado é imenso nos dias que correm. Não menos perigosa é a ideia, subsidiária à perspectiva anterior, segundo a qual a forma mais adequada de se deflagrar a revolução passa antes pela vontade particular de um grupo ou indivíduo. Nada mais desmobilizador que esperar de apenas uma parte a mudança do todo, nada mais paralisante e cristalizador que inferir de um episódio apenas o princípio de uma cadeia irreversível de eventos revolucionários. Nada mais anti-libertário que anunciar a revolução por profecias.

 

GAMA – Grupo de Afinidades de Movimentação Anarquista